18.8.14
15.8.14
ESCREVER
Uma pessoa faz a vida com tudo o que lhe cabe fazer, tem gostos, desgostos, desejos, frustrações, amores, desamores. No fundo de uma certa gaveta, vão adormecendo escritos, versos, desabafos, ficções, uma amálgama de letras, de palavras, em desordem, em revolta. Depois de tudo, surge na sua frente um tempo breve que precisa de preencher, de justificar, de enfeitar com o melhor que lhe ficou. É um tempo de desassossego, de atrevimento, de interrogação, de desacerto, uma vez mais. Pode então acontecer que encontremos quem nos faça um pequeno aceno e nos ponha ao de leve a mão no ombro, a dizer: Vai, continua, és poeta. Acreditamos na sinceridade, mas não na nossa capacidade. A verdade é que tudo começou nesse instante. A gaveta foi remexida, a escrita cresceu, fez-se hábito e vício. Os livros foram aparecendo, outros talentosos amigos elogiando, dando força. Cada vez são mais e a minha gratidão é infinita. Não desejo nada além de bons leitores, por poucos que sejam, e tenho-os, fiéis e generosos. Se ainda houver tempo, outro ou outros livros aparecerão. Se não, sou já uma mulher feliz que pegou na memória dos sentidos e, de pé sobre o silêncio, alongou o seu tempo breve, nomeou os seus sítios e assim vai preenchendo o espaço ainda livre do seu disco rígido.
Licínia Quitério
Publicado por
Licínia Quitério
Por favor comente clicando nas horas
6:55 da tarde
ESCADA DO TEMPO
Escada do tempo. Esteve sempre ali e estará. Foi o que pensei. Não a subi, não a desci. Pareceu-me ver um druída, com a sua foice de oiro, que a chuva miúda fazia crescer o gui. Regressei. Os seres da floresta precisavam de silêncio.
Licínia Quitério
Publicado por
Licínia Quitério
Por favor comente clicando nas horas
4:04 da tarde
AH A FAMÍLIA!
Era um tipo comum, mais do que seria desejável numa sociedade que preze a seriedade, o bom senso. Era bom profissional do seu ofício, dedicadíssimo aos patrões, melhor, fidelíssimo, acérrimo defensor se alguém a eles se referisse com irreverência ou mágoa. Dizia para quem o queria ouvir que gostava mais da empresa do que da sua família. Talvez levado por um copito a mais, num dia em que um patrão desqualificou o seu trabalho, perdeu as estribeiras, zangou-se a sério, avermelhou como pescoço de peru, disse ao patrão o que pensava dele e retirou-se, perante a estupefacção do dono de tão fiel criatura que agora lhe mordia a mão. Foi raiva de tal monta, que se despediu na mesma hora e não mais voltou a pisar a empresa, outrora objecto da sua mais pura afeição. Foi por esse mundo fora, nos caminhos de aventura de português sem trabalho, até que encontrou poiso onde exercer a sua profissão. Mandou ir a família, agora subida na escala dos seus afectos, e por lá ficou. Tem saudades da Pátria, de Fátima, e dos velhos tempos em que os comunas, mais tarde ou mais cedo, iam morar atrás das grades. Mau grado estes desgostos, sempre que pode pega na família e vem visitar o seu torrão natal que, diz, é o mais lindo do mundo. Podemos vê-lo nas fotos das festividades do Verão, sempre que possível na cadeira da frente, na fila da frente, ao lado dos ilustres, deitado em abraços sobre os mais robustos, pegando criancinhas ao colo, trincando o courato que é o melhor do mundo, comprando no sul blusas do norte, as mais lindas do mundo, que a família veste, porque ele assim o quer. Se o filho mais velho voltar à Pátria, à terra, esperto, trabalhador e crente e praticante como é, quem sabe não virá a ser, para começar, Presidente da Junta? De política não quer saber e tem raiva de quem sabe, mas se for preciso, por um filho tudo se faz. Ah a Família, a Família!
Licínia Quitério
Publicado por
Licínia Quitério
Por favor comente clicando nas horas
3:49 da tarde
IMPRENSA REGIONAL
Houve o Jornal do Fundão, houve o Notícias da Amadora, houve o Diário do Alentejo, houve o Comércio do Funchal e outros jornais regionais à frente dos quais estava gente culta, e cujos corpos redactoriais eram formados por pessoas que liam e escreviam bem. A censura massacrava-os, perseguia-os, suspendia-os, prendia directores e jornalistas. Eles lá continuavam, sem nunca abdicarem da qualidade da notícia, da divulgação cultural, sem cederem ao popularucho e ao beato que era apanágio de outros jornais, abençoados e benquistos pela Igreja e pelo Estado Novo.
Foram esses jornais veículo de informação honesta e desassombrada, de artigos excelentes, de bons autores, do melhor que a sociedade civil produzia e divulgava.
Esperar-se-ia que, depois da chegada da Liberdade, essa imprensa regional vingasse, crescesse, alargasse horizontes. Sonhos de Abril que não passaram de sonhos. Como em tantos outros ramos do jornalismo e da cultura em geral, regressaram os pasquins, entregues, salvo raras excepções, a gente que mal sabe escrever e que não faz a mínima ideia do que é jornalismo ou então a uma direita beata e reaccionária, catequisante e castradora.
Não serei a pessoa indicada para bem abordar este tema, felizmente sujeito a controvérsia, mas não quis deixar de a ele me referir, até porque conto, na minha história bem longa, a amizade com um censor, redactor do ex-Secretariado da Propaganda (SNI). A ele cabia censurar exactamente a imprensa regional, seguindo as regras estúpidas dos seus superiores. Ora quantas vezes assisti a essa tarefa e quantas vezes consegui convencê-lo a não cortar isto ou aquilo. O Jornal do Fundão, do saudoso Paulouro, era então uma vítima de eleição. Com o atrevimento que a mútua amizade consentia, dava-me ao luxo de dizer: Ó Homem, deixe lá passar isso, não acha que é mesmo uma estupidez? E ele, embora medroso de represália, lá deixava passar, dando algum descanso ao lápis azul.
Entendem, por certo, o meu desgosto quando, ao visitar uma terra, procuro o jornal regional e dou quase sempre com a maior miséria e iliteracia, que é um eufemismo para analfabetismo, penso eu.
Licínia Quitério
Publicado por
Licínia Quitério
Por favor comente clicando nas horas
3:39 da tarde
5.8.14
A NOVELA QUE NÃO SOU CAPAZ DE ESCREVER
Publicado por
Licínia Quitério
Por favor comente clicando nas horas
8:03 da tarde
3.8.14
A RUA
A rua vou-a descendo
O mar ao longe a fitar-me
A serra ao longe a fitar-me
Uns olhos entre a folhagem
Como se fossem verdade
Como se fossem miragem
E a vida vou-a descendo
E a rua minguando
O mar ao perto a fitar-me
A serra ao perto a fitar-me
Umas mãos entre a folhagem
Como se fossem verdade
Como se fossem miragem
No meu deserto de esperas
No meu bornal de viagem
Rua abaixo, vida abaixo,
Que assim se fazem os contos
Que assim se contam as contas
Do meu colar de surpresas
A alternar com tristezas
Que assim se fazem os dias
Rua abaixo, rua acima,
Vida acima, vida abaixo,
Um rosto entre a folhagem
Esse que é meu de verdade
Esse que não é miragem
Licínia Quitério
Publicado por
Licínia Quitério
Por favor comente clicando nas horas
9:46 da tarde
EMIGRAÇÃO
Publicado por
Licínia Quitério
Por favor comente clicando nas horas
4:58 da tarde
2.8.14
OS MENINOS CRESCEM
Publicado por
Licínia Quitério
Por favor comente clicando nas horas
10:26 da tarde
Subscrever:
Mensagens (Atom)