Quando eu era nova, não
comprava flores. Ofereciam-mas, em corte, em vaso, para a jarra, para o
quintal. E eu também as oferecia, ou roubava um tronquinho, como ainda faço. Levei
muito tempo a convencer-me a comprar plantas, flores. Ainda hoje raramente o faço.
Quando eu era nova, não comprava gatos, nem cães, nem pássaros, nem
peixes, nem cágados. Davam-mos ou vinham ter comigo. Até hoje, apenas comprei
peixinhos vermelhos para deitar em lagos. Quando eu era nova, não comprava
salsa, nem coentros, nem hortelã, nem louro. Davam-me ou ia eu colher. Tenho
sorte, ainda hoje me dão, para semear, para plantar, para usar. Quando eu era
nova, não comprava amoras. Colhia-as, picava-me, e, sem sequer lhes soprar o pó
do caminho, comia-as. Hoje não as compro, mas raramente as colho. Ficou-me o valor das coisas, o amor das coisas que me deram, que dei, que plantei, que colhi, que me
acompanharam, sem nada para a troca a não ser a promessa de ficarem na memória
dos meus sentidos. Coisas
de velha.
Licínia Quitério