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26.6.13

AS COISAS


  Quando eu era nova, não comprava flores. Ofereciam-mas, em corte, em vaso, para a jarra, para o quintal. E eu também as oferecia, ou roubava um tronquinho, como ainda faço. Levei muito tempo a convencer-me a comprar plantas, flores. Ainda hoje raramente o faço. Quando eu era nova, não comprava gatos, nem cães, nem pássaros, nem peixes, nem cágados. Davam-mos ou vinham ter comigo. Até hoje, apenas comprei peixinhos vermelhos para deitar em lagos. Quando eu era nova, não comprava salsa, nem coentros, nem hortelã, nem louro. Davam-me ou ia eu colher. Tenho sorte, ainda hoje me dão, para semear, para plantar, para usar. Quando eu era nova, não comprava amoras. Colhia-as, picava-me, e, sem sequer lhes soprar o pó do caminho, comia-as. Hoje não as compro, mas raramente as colho. Ficou-me o valor das coisas, o amor das coisas que me deram, que dei, que plantei, que colhi, que me acompanharam, sem nada para a troca a não ser a promessa de ficarem na memória dos meus sentidos. Coisas de velha.

Licínia Quitério

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