Há anos que ninguém lhe encontrava préstimo. Nem um leve
roçar de corpo, no assento, nem um braço a rodear-lhe as costas, nada. Passavam
sem a ver. Desciam a escada, apressados, como se vivessem o último dia.
Pensou: Já ninguém se senta, ninguém pára, ninguém olha o
céu, ninguém conversa, ninguém descansa. Dantes, ao luar, no meu colo pousavam,
e eu sentia-lhes as falas, os suspiros, e mesmo, quando o silêncio se fazia, o
bater dos corações.
Tão sozinha a cadeira. Sozinha e invisível.
Foi numa tarde de calma que, sem ajuda, moveu as pernas,
inclinou o dorso, rangeu os ossos e se atirou, sem temor do vazio. Um degrau a
acolheu, deitada sobre um dos lados. Ali ficou.
Hoje, os que passam por ela dizem: Olha uma cadeira
aqui deitada.
Ninguém a levanta. Ao menos, olham-na.
Licínia Quitério