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24.8.15

PALMIRA



Eu nunca estive em Palmira que viu passar os séculos, os povos, os artistas, os demónios. Palmira para mim é uma fotografia, muitas fotografias, algumas leituras, relatos em directo nenhuns. Palmira, portanto,  era como se não existisse. Uma cidade lá longe, numa encruzilhada de caminhos, muitas colunas, ruínas do que algum dia terá sido. Palmira, para mim que nunca lá estive, era uma cidade mítica. Falarem-me da sua existência era como falarem-me da Atlântida, ou de Ítaca, ou dos Jardins das Hespérides. Vivemos mais de paisagens inventadas que de lugares reais. Era assim que eu pensava em Palmira, ou não pensava, como penso, ou não penso, na muralha da China onde também não estive. 
Alguma coisa mudou para eu ter acordado a pensar na cidade de Palmira onde nunca estive. Dizem que apareceu um corpo de um homem pendurado numa das inúmeras colunas que restam de Palmira. Um corpo assassinado, exposto à turba das notícias, ávida de corpos assassinados, expostos. É um corpo de homem de que eu nunca tinha ouvido falar e cujo nome não sei pronunciar. É um corpo de um homem que estudava a cidade, o que foi a cidade, como foi a cidade. São precisos homens assim que estudam as cidades sobrevivas, os seus ossos enterrados, os seus muros esfacelados. Homens que me fazem pensar em cidades onde nunca estive e que as tornam minhas. Mataram o homem, ameaçam destruir o que resta da cidade, agitam a bandeira do medo, fazem-nos pensar no fim das cidades, dos homens que as habitam. Não sabem que há sempre uma cidade por debaixo da outra, e mais outra, e ainda mais abaixo uma pedra onde um homem há-de ler o princípio da cidade. Assim continuará Palmira, uma cidade onde nunca estive e em que pensei ao acordar.

Licínia Quitério

foto da net 

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