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6.1.17

DIA DE REIS


- Vê lá estas flores que me ofereceram. Tão bonitas, não são? Eu não me recordo de as ter visto em amarelo.
- Não conhecias? No meu quintal tenho montes delas, montes.

- Estou a precisar de uma receita de bacalhau que não seja muito conhecida, para variar. Sabes de alguma?
- Precisas? Faz como eu. Eu invento as minhas receitas e, não é para me gabar, mas saem sempre pratos muito apreciados.

- Ando com umas dores de cabeça há dois dias que nem te conto.
- Escusas de contar. Dores de cabeça tenho eu quase todos os dias, mas não me queixo. Não é por me queixar que as dores passam mais depressa.

- Já reparaste no meu novo corte de cabelo? Que tal? Fica-me bem?
- Para ser sincera, não gosto muito. Sabes que eu sou assim, muito sincera, quando gosto, gosto, quando não gosto, não me ponho com intrujices. Se tivesses um rosto mais redondo…
- Como o teu?
- Não digo tanto, mas parecido, talvez…

- O meu neto mais novo está muito engraçado, muito esperto. Sabes com que é que ele se saiu ontem?
- Ah as crianças são todas muito engraçadas, muito espertas, principalmente as nossas, mas conta lá a habilidade do menino.
Pronto, não fiques chateada, até parece que eu disse alguma mentira. Acredita que se eu fosse falar das gracinhas dos meus nunca mais me calava.

- Queres uma fatiazinha de bolo-rei? Comprei porque gosto de ter em casa neste dia.
- Eu não ligo nenhuma a dias. De reis ou de presidentes, são todos iguais, mas aceito.
Ah não se fazem bolos como os de antigamente. Olha-me para isto, nozes nem vê-las, e a massa, desmaiada, coitada, cortaram-se nos ovos.
- Lembras-te de quando traziam prenda?
- Não me lembro eu de outa coisa. Saía-me sempre a mim e os meus irmãos roíam-se de inveja.
- Pois a mim calhava-me a fava muitas vezes. Cada um é para o que nasce.
- Não sou nada dessa opinião. A vida é a gente que a faz. Há quem tenha jeito, há quem não tenha.
Bem, vou andando que a minha vida não é só conversatas moles, mas já agora levo outra fatia para o caminho.
- Leva, sim, uma ou duas.

Leva, para ver se adoças esse amargo com que nasceste.

(Segunda parte da fala, por detrás da porta fechada)

Licínia Quitério

foto da net

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