Conheço-a desde sempre, desde que eu era criança e ela uma jovem mulher, de gargalhadas frequentes e sonoras, loira, pobre, muito pobre, no tempo de muitos pobres, de vários e pesados trabalhos, de alguns filhos, minha vizinha, que o beco dela abria na minha rua. Décadas me levaram para outra terra e ela para outro beco a dar para outra rua.
Voltei
e encontrei-a, ficámos ambas contentes, rimos ambas, ela com a sua sonora
gargalhada, a tratar-me por menina, eu já não loirita, ela ainda, na sua matriz
celta, persistente. Gostei de a ver, já sem a moda da penúria que dantes lhe
coubera. Estava bem, os filhos criados, na sua casinha modesta, com o conforto
que nunca tivera. Passei a vê-la quase diariamente, na sua bica e bolinho,
ambas no mesmo café, como está a menina, como está a senhora C. Vamos
envelhecendo as duas, ela mais adiantada do que eu, sabe-se lá quem chegará
primeiro.
Ultimamente
não a encontro de boa saúde. A senhora C tornou-se uma velha em banco de
jardim, perdido o garbo que nem a pobreza lhe tirou, os cabelos loiros
desalinhados, o olhar perdido sabe-se lá em que becos. Respondeu-me ontem
apenas com um aceno, sem menina, sem a gargalhada que sempre lhe nascia na
garganta.
Licínia Quitério
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