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15.7.19

A ALDEIA DA FONTE BRANCA

Solteirão, o Fausto, mulher de aconchego só uma lhe conheceram, mas dela não falam, foi um desvario, um mau passo do rapaz, para a rapariga não passou de aventura, mais uma, sem amarrar saudades. Francesinha de ideias livres, deu-se a provar a um pobre imigrante, conhecido da porteira do prédio. Foi o bom e o bonito, foi. A miúda achou-o giro, nunca se tinha deitado com um português, tinha ouvido dizer que eram um bocado primitivos, mas bons machos, não lhe custou nada convencê-lo à experiência. Fausto não entendeu a rapariga, ou não quis entender, só sabia que uma coisa apetitosa daquelas a cair-lhe nos braços, a deitá-lo na cama, era de aproveitar, parvo seria se o não fizesse. Deu conta do recado, a francesinha delirou, Fausto nem acreditava que lhe tinha saído a sorte grande. Sorte teria sido, sim, se ela não se tivesse fartado do portuga, sexo com ele era bom, mas, “putain”, ele não falava de assunto que tivesse interesse, a bem dizer quase não falava, e Julie, que depois do sexo não prescindia do cigarro e de uma boa conversa, fartou-se mesmo e despediu-o, “salut”, ficamos por aqui. Fausto percebeu como era fácil despedir um imigrante como ele, fosse do trabalho, fosse do amor. No fundo do desgosto, jurou que da cama nunca mais nenhuma mulher havia de despedi-lo. Só ele sabe se a jura se cumpriu, certo é que o tempo passou e Fausto continua o solteirão macambúzio, que uma vez amou Julie, que uma vez foi rejeitado por Julie. No outro dia viu uma mulher que lhe pareceu Julie. Ele ajudava na descarga de um camião de móveis, ela estava sozinha, sentada na esplanada do café em frente. Fumava, o cigarro entre o polegar e o indicador, como Julie antigamente, traçava a perna, um dos pés a fugir para debaixo da cadeira,como Julie antigamente. Uma mulher de meia idade, atraente ainda, talvez fosse Julie. Quantas vezes já viu mulheres que lhe pareceram a sua Julie, que sua nunca foi, mas sua gosta de a pensar. Para essas visões recorrentes, Fausto arranjou uma explicação, Julie é uma mulher vulgar, igual a muitas outras, mas outra explicação há-de haver, um dia há-de descobri-la, para se ter apaixonado por ela.

Licínia Quitério, em "A Aldeia da Fonte Branca", a publicar 

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