Falar da Dona Tela é um exercício arriscado, um solilóquio,
uma expiação. Encontrei um pequeno texto que escrevi há um bom par de anos, em
resposta a alguém que perguntou quem ela era, e que aqui transcrevo.
"A Dona Tela não sou eu, se bem que por vezes gostasse de
ser. Penso que a conheço, ingénua mas não burra, desbocada que baste,
deslumbrada por futilidades, de coração de manteiga, presa não tão fácil como
parece, mas com perigosas fraquezas, quarentona, sedutora ainda, suburbana e
pelintra, muito pelintra. Passo muito tempo sem saber dela. Depois aparece,
sempre atenta ao mundo, com a sua linguagem muito viva e heterodoxa."
Ainda hoje ela se me apresenta, agora com as unhas pintadas
de azul, as leggings a comprimir algumas molezas, um ombro bem destapado, a jeitosa
lá do bairro. Continua a ver telenovelas, sonha com um highphone de último
modelo e tem a foto do CR7 ao lado da do dito-cujo, o tal que vende aspiradores
e lhe comprou um pedacinho da alma. Só um pedacinho, que a Dona Tela é uma
mulher prá-frentex que chora baixinho e ri muito alto, escandalosamente.
Confessou-me que simpatiza com a geringonça, mas não me diz qual o elemento do
trio ela prefere.
Se eu sou a Dona Tela? Toda a gente sabe que não.
Licínia Quitério
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