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27.1.15

O EMBRULHINHO


Subia a escada muito depressa, trazia um embrulhinho na mão, vinha excitada, os grandes olhos a brilharem e dizia, repetidas vezes, é uma prenda, é uma prenda para a L. E dizia desembrulhe, desembrulhe, e a L, surpreendida e divertida com o entusiasmo da cachopinha, desembrulhou os dois pequeninos castiçais  de metal doirado, a reluzir. Gosta, gosta? E a agarrar-se ao pescoço da L, um beijinho de cada lado, parabéns, parabéns.  Vinha a menina para a sua primeira aprendizagem de língua francesa, que o Pai dela, professor muito querido da L, assim quisera, para algum embaraço da L, também ainda menina, nos seus dezassete anos, nesse dia a chegarem, tão verdes, tão verdes ainda. A cachopinha de cabelo loiro aprendia a dizer bonjour, je m’appelle M, le chat est très joli, au revoir mademoiselle, por vezes sentada nos joelhos da L, numa meiguice, numa alegria dos seus sete aninhos, e a L aprendia a ensinar, com a sua primeira aluna, tão inteligente a miúda.
Cresceu a M, cresceu ainda a L, a vida separou-as, longe, longe, muito tempo, tanto tempo, até que um dia voltaram a encontrar-se, no Outono das suas caminhadas, a M ainda numa corrida, ambas num abraço enorme, a L a fazer anos, outra vez, e os grandes olhos da M de novo ali, e o sorriso, e os sorrisos, e as vidas tão longas já, tão lembradas do princípio.
Os castiçais pequeninos moraram em várias casas, em várias vitrinas, escureceram um pouco. Hoje foram de novo embrulhados e metidos numa mala. Vão voltar às mãos da M. As coisas devem conhecer os seus caminhos de regresso.

Licínia Quitério

1 comentário:

Era uma vez um Girassol disse...

Adoro histórias, como sabes, minha amiga!
Um belo texto...
A primeira aluna, o presente, os sorrisos, a aprendizagem e por fim os abraços do reencontro e o regresso à origem....Benditos reencontros!
Adorei!
Beijinhos

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