Dizia amiúde
coisas estranhas. Fora do contexto das conversas em que a julgavam presente.
Faziam-lhe perguntas incómodas: Sabes que o Fulano deixou a mulher? Não, não
sabia. Nem sabia sequer quem era Fulano. Porque esperavam que tivesse algo para
dizer, arriscou: Como ficaram os olhos dela? As mãos dele agora estão vazias?
Gostaria de saber. Mas ninguém tinha as respostas. Continuaram: Parece que
arranjou outra. Exclamou: Oxalá gostem do mesmo mar. É tão importante para
viajarem num barco de dois lugares. Dizia coisas francamente esquisitas.
Também os gostos dela eram bizarros. Chapéus com fitas coloridas, terras
vermelhas, jogos de palavras, casas velhas. E já ninguém a podia ouvir afirmar,
em ladainha: Gosto tanto! Nem valia a pena perguntar-lhe: De quê? Era sempre o
mesmo. Subia ligeiramente os ombros, apertava as mãos e sorria com os olhos
húmidos. Alguém um dia comentou: Parece que saíu dum quadro de Renoir. Ela não
deve ter ouvido, senão teria sussurrado, com aquela voz sedosa e distante:
Gooosto.
Licínia Quitério
1 comentário:
Renoir, sem dúvida!
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