TEMA
«Que fado te enraizou, porque cresceram os ramos no teu corpo de mulher?» — perguntou o caminheiro enquanto se apoiava no bordão, dispondo-se a ouvir a história.
«Bem, eu…»
DESENVOLVIMENTO
Bem, eu tenho nas seivas lembranças de mulher. Correm rápidas quando a primavera se anuncia e o meu tronco estremece e nos ramos passam falas que vegetais não são. Não sei ao certo o que quer dizer amor, mas sei que é quando os pássaros me procuram e se aconchegam por entre a macieza verde da folhagem. Lembro-me da ardência do verão na pele que já foi seda e agora é lenho. Chamam-me louca porque me dispo quando chega o frio. Nunca o fiz quando tive o nome de mulher e só à lua mostrva o meu corpo livre, leve, quente por dentro da noite, quando as florestas me chamavam. Não sei quando os meus pés se afundaram na areia e se alongaram e procuraram os bichos cegos de pelagem suave. Foi há muito tempo já. Foi, já te disse, quando eu ainda tinha nome de mulher. Nesse tempo eu queria saber do interior da terra e das alturas do céu. E corria, corria. E tudo me fugia. Agora que me chamam árvore, sei dos segredos da água e da escuridão da terra. Sei também da espessura do azul que acaricia os muitos braços que ganhei. Esqueci o rosto que já tive. Tenho agora os mil rostos dos caminheiros que me fitam. Sei muito de árvore e pouco de mulher. Quem me fadou não sei que forma tem. Dele só sei um nome. Sonho. De sonhar. Respondi-te?
Licínia Quitério
foto da net
1.12.10
ESCRITA CRIATIVA
Publicado por Licínia Quitério Por favor comente clicando nas horas 1:49 da tarde
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